quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Ficando VELHO... O tempo passa rápido e como passa! 46 anos no ar não é fácil...

Nós que gostamos de voar, que nascemos para isso, que amamos o que fazemos quando estamos com nossos aviões, nosso mundo, é impossível aceitar ficar no solo, pois tantas oportunidades o céu nos dá para curtir lindos e inesquecíveis momentos. Quem nunca saiu do chão não sabe avaliar a magnitude de quem voa. As belezas que o céu proporciona e as oportunidades que surgem. Voar é maravilhoso, cativante, sensacional, simplesmente fantástico.
Somos seres especiais que Deus nos deu a oportunidade de ver a terra lá de cima, enquanto os terráqueos vivem cá embaixo envoltos em curiosidades, indagações e cheios de mistérios. Quem voa está acima de tudo e de todos. Uns voam, outros rastejam como os repteis, assim é a vida nos dois sentidos da palavra. O Tempo passa muito rápido, o tempo voa, vai desaparecendo no horizonte. Perguntar quem é mais Feliz nesse contexto não se sabe. Cada qual vive seu momento, seu tempo de acordo com a sua predestinação. Os Eleitos são especiais. Os aviadores são Especiais. A vida só tem sentido para aqueles que se aventuram nos caminhos do céu sem medo, encarando com muita serenidade um voo com ida e volta. Voo sem retorno não tem logica. 
Quando você se prepara levantando cedo, antes da hora da decolagem prevista e caminha para o seu avião, você sempre tem a certeza da ida e da volta. O duro é quando alguns partem aleatoriamente na esperança da volta duvidosa e muitas vezes isso não acontece. Sejam por falta de planejamento, treinamento, ansiedade e pressa. Momentos obscuros, circunstancias adversas, sem necessidades, muitas vezes além das fronteiras e da capacidade por inúmeras situações, complicam o meio de campo. O importante é saber lidar com os pontos obscuros, perigosos e cheios de armadilhas.

Sempre que deixamos nossos hangares, procuramos voltar. É a mesma coisa que sair de casa, deixar o lar pelo trabalho e retornar no nosso ninho. Quando alguns pássaros saem para a labuta, muitas vezes não regressam. Acidentes de percurso acontecem, são abatidos ou mesmo impedidos de regressar. A vida é assim, uns partem, alguns voltam, alguns desaparecem. É cheia de oportunidade e  também de riscos. Seres Alados são especiais e quando escolheram viver assim, sabiam que não seria fácil, mas que apesar dos riscos seriam momentos gratificantes além da imaginação dos terráqueos.  Para o avião, o céu não tem limite... O horizonte é a nossa meta, você consegue voar além da imaginação. Nós precisamos conhecer os nossos limites e os da maquina que voamos. Muito simples, os aviões tem sentimentos, eles nos dão aviso, basta compreende-los.

Desejo a todos os meus queridos amigos Aviadores e Aviadoras um maravilhoso Ano Novo, cheio de esperanças, muita saúde, boa sorte e bons voos sempre...

                             FELIZ 2019.

Que Deus oriente esse nosso novo Presidente, que vai assumir esse governo tumultuado a partir do próximo ano. Que coloque ordem na casa, terminando com a corrupção, os roubos e a desordem. Que ele consiga escutar o grito dos aviadores, ressuscitando os Aeroclubes que foram praticamente banidos do espaço, por questões ideológicas, desorganização e falta de gerenciamento, aliados a gestão de uma agência cheia de elementos não sei se antiaéreos, destreinados e sem vocação para o cargo que ocupam, fazendo uso do poder e criando a maior fabrica de multas da história da aviação brasileira. Dificultam e atrapalham. Saudades do velho DAC – Departamento de Aviação Civil, formado pelos militares da aviação, o qual era o nosso gestor na nossa aviação em geral. Nós tínhamos o dialogo cara a cara e nos entendíamos muito bem, na sua maioria pilotos como nós. Existe sim uma ouvidoria que não ouve nada por ser tão burocrática.
Hoje depois de tantos anos fico muito triste ao ver a situação em que se encontra a nossa aviação, já quase sem esperança diante além dessas dificuldades impostas, enfrentando outro maior terror, o preço elevado do combustível que nos castiga quando vamos voar e as exorbitantes taxas aeroportuárias.  Acabou o glamour do serviço publico federal que tínhamos e das saudosas subvenções.
A morte dos Aeroclubes foi o fim da picada. Espero que eles voltem a funcionar. Alguém terá que enxergar como os Aeroclubes foram importantes para a formação de pilotos. Milhares deles, que se encontram nos mais variados segmentos  da aviação, saíram dos Aeroclubes, inclusive eu. Penso que os pilotos oriundos daquela época já nasciam com vocação e com sonhos a serem conquistados e a presença dos Aeroclubes tinha uma tremenda importância nessa empreitada. Eram entidades sociais, representativas para o publico e faziam a diferença em uma cidade, onde eram preservados e cuidados com carinho e amor. Havia uma pureza no ar que foi desaparecendo com as turbulências.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

TERRITÓRIO DE RONDÔNIA... Quem te viu quem te vê!

Nos anos 1978 e 1979 fiz muitos voos para o Território de Rondônia, hoje Estado de Rondônia. Voava como Comandante de um Cessna-210 L Centurion 1974, o PT-KHF que pertencia A INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE FRUTAS de Matão-SP, depois transformada em CENTRAL CITRUS, que acabou fechando suas portas. 
Morava em uma casa cedida pela empresa, na Fazenda Boa Vista dos Ingleses, Bairro Toriba em Matão-SP e a aeronave ficava baseada em Araraquara-SP, naquela época SSAK, hoje SBAQ.  O mesmo hangarzinho de madeira que foi da Construtora Igaraçu Ltda, onde comecei a voar como Comandante entre 1974 a 1976, cujo velho hangar  antes pertencia ao Sr. Edmundo Lupo.
Matão tinha pista de pouso, o SDLY, cuja área do Campo de Aviação foi cedido pelos ingleses para a Prefeitura Municipal de Matão-SP, mas os hangares estavam começando a serem construídos. Os proprietários da Sociedade, Indústria e Comércio de Frutas Matão Ltda eram: Orlando José Scutti, Salvador Scutti e Milton Groppa Aquino. O Miltão era quem cuidava da abertura e dos negócios da fazenda. Era um grande companheiro, um verdadeiro amigo. Variavelmente também utilizava aquele aeródromo publico. Quando não estava voando para a Rondônia, onde a empresa havia adquirido uma Gleba de Terra e estava abrindo uma fazenda, explorando parte da madeira, que era obrigatório e por lei ser desmatada. Fazia também quase que regularmente, voos de malotes para São Paulo-SP destino ao Campo de Marte pelo menos duas vezes por semana, onde a empresa  mantinha no CEASA uma distribuição de laranja e limão. Paralelamente, muitas segundas-feiras levava com o Centurion a filha de um dos patrões, que estudava Odontologia em Mogi das Cruzes-SP, e ia buscá-la nas sextas-feiras utilizando o aeródromo Hiroy em Biritiba Mirim-SP.


Devo muito ao Milton, Orlando e ao Salvador, que custearam todo meu treinamento na aeronave Centurion-II PT-KHF, pois naquela época os aviões que recolhiam o trem de pouso eram considerados do "GRUPO B" e havia necessidade de treinamento para receber a credencial, segundo exigências do DAC - Departamento de Aviação Civil que era o gestor da aviação em geral no Brasil. Fiz todo treinamento no próprio avião da empresa que iria voar, com a supervisão do Instrutor de Voo: Alvaro Ivo Thiezerini de Monte Alto-SP , que voava na época um Centurion igual, pertencente ao Armador Sr. Félix de Matão-SP.

Relembrar e falar desses voos chega a ser até inacreditável por mim mesmo, principalmente por voar em um tempo sem muitos recursos, no "Arco e Flecha" e no "Pau e Bola". Decolar a noite quando os aviões monomotores ainda estavam proibidos de voar noturno e IFR aqui no Brasil. E era assim que funcionava, decolagem noturna as 04:00 da matina de SSAK/Araraquara.....percorrer 1.200 Km até Cuiabá-MT em 04:00 hs de voo, só na bussola e no ADF. Quando os funcionários estavam entrando no escritório da empresa em Matão-SP, estávamos pousando em Cuiabá-MT, cumprindo a primeira etapa da viagem. O curioso Plano de Voo era chamado de Ficha 227, muito simples e objetivo...
Depois o trecho ficava pior e com menos apoio, mas era visual. Cuiabá – Vilhena/RO, Vilhena - Pimenta Bueno/RO. Pimenta Bueno era nossa base operacional para ir para a gleba.  De lá voava para Espigão D'Oeste, pousava em uma rua, guardava o avião no quintal da casa do responsável pela gleba e de lá com seus cavalos, íamos  levando mantimentos e outros apetrechos por entre o mato em picadas, atravessando riachos, até onde a fazenda da empresa estava sendo aberta. Dormíamos em redes, tomávamos banho no rio e comíamos alguma caça, sobrevivendo também  por dias com os mantimentos que levávamos.

Hoje nem acredito que fazia isso sem se preocupar com nada e confiante, talvez fosse a idade arrojada e cheia de desafios sem pensar nos perigos e no medo. Acho que voar naquela época era uma grande Aventura para um jovem inexperiente, mas cheio de vontade. E assim foi minha caminhada na aviação, aprendendo a confiar nos instrumentos que tinha e que os mais velhos e mais ousados me ensinaram como funcionava. Quando iria imaginar nas facilidades de hoje com o advento do GPS, jamais!
Aprendi a acreditar na bussola, no cronometro e no horizonte artificial e alguns cálculos primários de navegação com o computador de voo manual Jepessen E6B. Aprendi a voar ADF na marra, IFR foi entrando e saindo de nuvens e estudando muita meteorologia no Manual do Farid Ched/ Grande meteorologista, usando o Atlas de Nuvens e Observação na superfície. 








Aprendemos um pouco de Morse, para tentar identificar os indicativos de ADF e o Código Q, o mesmo que utilizavam os radioamadores para nossas comunicações. QAM era o Boletim meteorológico um tanto demorado, QAP era estar na escuta, QRM era interferência na radiocomunicação, QRV era estar a disposição e assim por diante, iam descortinando o código Q nas mensagens radiotelefônicas.
De Cuiabá para Vilhena-RO o ADF ajudava bastante. Voava com o ADF no QDR (ponteiro do indicador apontando para  cauda da aeronave) até o sinal ficar fraco e ir sumindo com o distanciamento da aeronave de Cuiabá-RO. A seguir permanecer no curso, confiando na bussola e no tempo remanescente estimado, passando a escuta do radio VHF na frequência 126.70 Mhz da Estação da FAB em Vilhena-RO, que facilitava a navegação gratuitamente com o serviço de Recalada, o que consistia em uma contagem de 0 a 10 pausadamente com o PTT do radio acionado continuamente e assim ao receberem o sinal pela intensidade conseguiam determinar a posição da aeronave e guiar a navegação informando algumas vezes o nosso novo curso em graus de desvio pela bussola.
 Ao pousar em Vilhena –RO ia direto até a estação da FAB agradecer o operador, nosso Anjo. De Pimenta Bueno-RO pouco apoio que tínhamos para determinar a navegação era a BR-364 de terra que na época das chuvas era um terror para os caminhoneiros e os ônibus. Aviões lançavam cargas de alimentos para eles quando ficavam sitiados ao longo da cruel estrada. O pessoal  do Exército também ajudavam com seus equipamentos em uma verdadeira operação humanitária.



















Finalmente de Vilhena-RO até Pimenta Bueno-RO a coisa era mais mansa, a BR-364 era um tremendo apoio.
Ficávamos em um único e pequeno Hotel, onde era feito contato com os responsáveis pela gleba, que cuidavam da área determinada para a empresa. Em Pimenta Bueno era também planejada a operação da viagem, com compra de mantimentos, munição para defesa e caça, etc... A seguir decolávamos para Espigão D'Oeste-RO, onde se iniciava a partida por terra com auxilio de cavalos até a gleba. Geralmente ficávamos vários dias hospedados na casa de madeira feita de tabuas confeccionadas com moto-serra.
Muitas vezes voávamos para Cacoal,  Presidente Médici e Ji-Paraná. Quando havia uma folga gostava de ir até a tribo indígena em Riozinho ver os índios ou até o Rio Ji-Paraná, onde era pura diversão. Certa vez um piloto deu um raso no rio com seu C-198 Skylane, onde havia o cabo de aço da balsa que acabou não vendo, impedido pelo forte sol e acabou colidindo. Se não me engano houve apenas um sobrevivente que estava no avião. Coisa terrível que acabou ocorrendo por imprudência e brincadeira. Em Espigão do D'Oeste-RO achava curioso o cemitério, onde plantavam cereais entre os túmulos. Devia ser arte do coveiro.






O PT-KHF ficava baseado também boa parte do tempo, no Campo de Aviação de Pimenta Bueno-RO aos cuidados do guarda campo que zelava pelas aeronaves , pois morava lá mesmo no aeródromo.
Foram tantas e tantas viagens, memoráveis e históricos voos. Na época das férias escolares o Miltão aproveitava aviagem para levar os seus garotos e sobrinhos( Miltinho, Dudi, Rudinei e outros) que residiam em Matão-SP, para conhecer a Rondônia e voávamos por lá. Era maravilhosa a companhia dos garotos se aventurando e descobrindo a Selva. Passamos bons momentos juntos. Fizemos grandes incursões pela Selva, com auxilio dos mateiros, tomávamos banho nos riachos, pura adrenalina. Era impressionante o tamanho das Castanheiras, parece que atingiam o céu. A noite o céu límpido ficava repleto de estrelas. Milhares delas até o horizonte. Um verdadeiro espetáculo.










Velhos Tempos, Lindos Dias !