quinta-feira, 8 de julho de 2010

PERFIL, "HOMEM E AVIADOR"




Os que voam são diferentes. São pessoas especiais, com firmeza de pensamentos, confiantes e precisos. Simplesmente o tempo voa, passando extremamente rápido, por isso os que vivem no ar são decisivos, incomparáveis e até mesmo imbatíveis.
O aviador, homem do espaço, acima de todas as coisas aprende a conviver em velocidade. Tem que ser ágil e assim sendo tão especial, ele é quem deve definitivamente tomar as decisões. Certas ou aparentemente erradas, mas tem que tomar. E tudo acontece numa velocidade fantástica. Independente de qualquer outro ponto de vista, esquecendo muitas vezes os próprios regulamentos, nos momentos de decisões, o poder se encontra em suas mãos. Essas mesmas mãos que firma o comando e cria a maturidade que permite o vôo, que eleva o avião no ar com um gesto tão suave.
O tempo em constante aceleração cobra do homem que voa uma gama de decisões momentâneas, cujas soluções estão expostas e fatalmente devem ser tomadas, pois voar acima de tudo é um dom, algo que nasce com o aviador. São comungar todos os dias os infinitos mistérios do céu. É estar preparado, confiante e seguro. Afinal nem todo ser humano é corajoso, mas o aviador nato entende que as dificuldades são feitas para serem vencidas, não as vendo como barreiras, mas sim como trampolins que nos impulsionam, obrigando-nos a superá-las. O homem que voa não pode ser comparado aos outros de vida comum. Na sua caminhada, nessa difícil escola da vida onde o fundamental é a autoconfiança, o aviador não se pode julgar que sabe tudo, sendo bom demais, mas que esta sempre aprendendo, por isso não é tão ruim assim. Ele deve trilhar a dura linha do meio, sem jamais se convencer que é tão bom, pois fatalmente se dará mal. Cada aviador particularmente deve conhecer suas limitações e também a própria limitação da maquina. A autoconfiança e a humildade são duas qualidades do verdadeiro homem que voa trilhando a difícil linha do meio. É uma virtude, a meio caminho entre a perfeição solidamente edificada no mais alto nível e o razoável existente nos níveis inferiores dessa atividade tão técnica.Quando temos a confiança e a humildade, o mundo nos pertence ou parece nos pertencer de formas concretas, cheias de realizações pessoais. Quando não as temos, de nada adianta a nossa inteligência e magnitude da nossa máquina, que dificilmente conseguiremos chegar próximo da perfeição. Se analisarmos bem, perceberemos que todos nós somos seguros em alguma coisa. Não somos bons em tudo e nem poderia ser de outra forma. A diferença básica entre os aviadores extremamente seguros e os outros, está na maneira como os primeiros encaram o problema. A autoconfiança não necessariamente significa que iremos fazer tudo certo. Significa que, quando nos deparamos com alguma situação difícil, sabemos que com algum trabalho, poderemos superá-las. Dessa maneira a confiança aumenta com as horas de vôo e nós descobrimos que o importante em certas situações é não errarmos. Na aviação tudo é uma questão de sobrevivência, onde não pode existir o erro. Assim se estuda e treina diariamente, pois o verdadeiro aviador amanhece e vai dormir pensando aviação. Com toda sensatez do mundo nós aviadores um dia paramos no tempo para analisarmos a nossa vida, e ao fazermos um balanço geral da nossa aviação, descobriremos que pelo menos para nós foi gratificante ter escolhido essa profissão tão arriscada. Descobrimos que somos capazes, livres e felizes acima de tudo, por que nós conseguimos entender perfeitamente os aviões, essas máquinas maravilhosas com que voamos. Esta liberdade é que nos proporciona a condição de irmos aos mais longínquos pontos, onde só o avião e o pensamento conseguem chegar. E assim, enfrentando os mistérios desse magnífico e infinito céu pudemos conhecer pessoas, fazer centenas de amigos, deixar uma boa imagem do avião por onde estivemos.
Entretanto tudo tem o seu preço. Nessa doutrina de vida de aviador passamos a maior parte dos nossos dias longe de casa, longe dos familiares que acabaram aprendendo a conviver sozinhos. Às vezes sem muito conforto, distante de tudo e de todos a calma nos ensinou que isso fazia parte da profissão que havíamos escolhido. Derrepente você está aqui e agora. Algumas horas depois você está tão longe e nem tudo é um mar de rosas, mas aprendemos a conviver com a turbulência, a enfrentar os nevoeiros e a se safar do mal tempo, nosso maior inimigo. Talvez mais que qualquer outro ser humano, o aviador acaba desenvolvendo o espírito de decisão em intima ligação com a vontade que comanda sua atenção, esforço e dedicação. Virtudes essenciais que demonstram qualidades de quem voa. O tempo passa rápido e ao recordar o passado, refletindo sobre nossa vida veremos que nem tudo se passou em nuvens brancas, mas a sorte esteve sempre ao seu lado, porque muitos por muito menos já se foram, deixando suas experiências e recordações em nossos corações. Seus erros não foram perdoados. Deus certamente foi o nosso maior Co-piloto nessa caminhada pelo tempo e espaço, nem sempre num verdadeiro céu de brigadeiro. O preço pago pela sobrevivência foi muito alto e veremos que estivemos suscetíveis a falhas, que estivemos bem próximo do fatídico.Em especial, os que voam por amor a profissão abraçada sabem que aviação não deixa ninguém rico como se imagina, Vive-se. O único tesouro adquirido são as grandes amizades cultivadas aqui na terra. Assim nesse vai e vem a meio caminho entre o céu e a terra, vamos envelhecendo gradativamente dando lugar aos mais novos e desejando-lhes a boa sorte que sempre esteve ao nosso lado.
O bom aviador é aquele que continua vivo. Aquele que conseguiu superar a lei natural das coisas, conseguindo acumular um admirável numero de horas de vôo e esteve enfrentando durante longo tempo de uma ou de outra forma, os mistérios do infinito azul que nos cobre. Nossa riqueza é que continuamos voando, apesar dos riscos que enfrentamos. Certamente temos a maior gratidão que é a liberdade, a mesma que tem os pássaros e assim poderemos dizer com orgulho um dia, valeu à pena ter sido aviador.

Um comentário:

  1. A leitura do texto acima, me deixou realizado ao lembrar dos dias em que voei pulverizando canaviais.
    Hoje com 68 anos, 25 anos após, lendo esse artigo me vi, embora classificado na época como um mero aviador de agricultura, recompensado pelas muitas horas de vôos, sem ter responsabilidade com pessoas, contudo com a obrigação de cuidar das plantações de cana e algodão.
    Para minhas lembranças escrevo no recanto das letras algumas passagens arriscadas e emocionantes pelas quais passei pilotando uma "máquina" de pulverização. recantodasletras.uol.com/luzirmil.

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